EDITORIAL
Resumo
Temas e áreas marginais na saúde
Temas e áreas marginais na saúde
A primeira aula que lecionei a estudantes de enfermagem tinha como tema central os cuidados de enfermagem aos migrantes. Estávamos no final dos anos oitenta do século vinte e Portugal não enfrentava nenhuma crise migratória digna desse nome. Apesar disso, este era um tema que integrava o plano curricular do curso de enfermagem e, claro, da unidade curricular que então lecionava. Tratava-se, no fundo, daquilo que tempos mais tarde se viria a designar como cuidados culturalmente competentes numa clara influência da Teoria da Diversidade e Universalidade do Cuidado e/ou Enfermagem Transcultural de Leininger.
Na altura pareciam prever-se os tempos futuros, pautados pela vinda para Portugal, durante os anos noventa do século XX de um importante número de cidadãos provenientes do continente africano (sobretudo dos PALOP) e que culminaram com uma grande vaga de migrantes do Leste europeu e com a chegada da segunda vaga de pessoas oriundas no Brasil, durante os nos primeiros anos do século XXI. Desde aí os movimentos migratórios não pararam e hoje Portugal (embora não faça parte dos países com mais migrantes ou que mais migrantes recebe atualmente, ao contrário do que algumas forças políticas afirmam) confronta-se com fluxos migratórios essencialmente de países asiáticos, de cultura, costumes e crenças desconhecidos de muitos profissionais de saúde.
Por mera coincidência, a última aula que lecionarei tem precisamente o mesmo tema e faz parte de uma unidade curricular de Saúde e Sociedade onde pontuam os chamados temas marginais (saudificação, sobdiagnóstico e a medicalização, a macdonaldização dos cuidados, questões de género, a violência interpessoal ou cuidados às populações migrantes, entre outros), que desde o início da década de noventa do século vinte foram integrando paulatinamente o plano curricular do curso de enfermagem, e a que sempre estive direta ou indiretamente ligada como docente e/ou investigadora, em grande parte devido à minha especialização em enfermagem de saúde pública e à minha formação complementar de sociologia. Mas essencialmente devido à minha inquietação com a sociedade em que vivo e à forma como nela, a cada momento, as dinâmicas dos cuidados de saúde se vão mantendo, alterando ou reconstituindo.
DOI: http://dx.doi.org/10.60468/r.riase.2024.10(01).672.3-7
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